domingo, 6 de fevereiro de 2011

Ballet: dança nobre

A dança é uma arte antiga. Nasceu da necessidade do homem de se expressar e se sofisticou ao longo do tempo. Hoje, dançar envolve tantos ritmos e formas que fica difícil escolher o que mais encanta, seduz... O que mais surpreende...

O balé clássico é certamente um dos mais belos. Quando surgiu, era dançado - sobretudo - por homens. Mas foi na figura da bailarina que ganhou a magia que tem. Na coluna Coisas do Gênero de hoje, uma homenagem à protagonista da mais aristocrática das danças.

Quem pára e olha as meninas dançarem, se pergunta: de onde vem essa mágica que eleva os pés para tão longe no chão, faz o corpo dobrar como galho no vento? Pensa que elas devem aprender isso em uma espécie de irmandade.

A iniciação começa cedo e marca o destino de gueixa. A linguagem vem do francês. Mas o gestual só elas entendem. Também há a música. Sem ela, as bailarinas não sonham...

A entrada nesse mundo seleto, quase aristocrático, não é franca. São cobrados persistência, dedicação e atributos físicos.

“A bailarina deve ser alongada, se possível, magra. Tem que ter as pernas longilíneas, um pé bonito, pescoço e braços compridos. Além disso, uma expressão e uma técnica que dê certo”, explica uma professora.

Além de um talento que poucas têm... “Lamentavelmente, são muitos os convidados, mas poucos os escolhidos”, comenta a ensaiadora do Ballet Teatro Municipal, Eugênia Feodorova.

A mestra russa Eugênia Feodorova lança um olhar implacável sobre as jovens aspirantes e não esconde a verdade: “É difícil quando vem uma mãe com uma filha que não tem nada a ver com o balé e quer que eu faça dela uma bailarina. É difícil. Eu tenho que chegar para a mãe e dizer: não dá”.

Mesmo quem entra em uma grande escola não tem a certeza da glória. A família é só uma parte da expectativa.

“A minha família se mudou para cá e minha mãe e meu pai tiveram que conseguir emprego pelo meu sonho de estudar no Ballet Bolshoi”, conta uma bailarina.

“A minha vida mudou toda. O meu pai ficou em um outro estado, o meu irmão também. Eu vim para cá com a minha mãe”, lembra outra bailarina.

A maior cobrança vem delas mesmas...

“Eu gosto da força de vontade da bailarina”, observa uma pequena bailarina.

Os antigos romanos inventaram uma forma de teatro em que a palavra não era necessária. O corpo, com gestos precisos, contava a história. Era a pantomima, uma das origens do balé. Desde então a maquiagem, as roupas e o cenário passaram a ser importantes no espetáculo. Nesta grande caixa de fantasias, a bailarina começa a traçar na ponta dos pés um mundo encantado, onde ela pode ser tudo ao mesmo tempo.

Quebra-Nozes, Lago dos Cisnes, A Bela Adormecida são alguns nomes desses grandes balés. A euforia ao espreitar atrás da porta lembra que elas ainda são meninas.

Os maneirismos e ares de princesa escondem a ansiedade. A respiração quase pára ao ver as mais velhas transarem. Para chegar lá, elas suam, castigam as sapatilhas em uma coreografia repetitiva, marcada por um som que o público não conhece. As bailarinas ganham intimidade com o solo, desafiam as dores e a anatomia humana.

“O nosso corpo não foi feito para fazer 80% do que essa técnica demanda. Nós não nascemos para levantar tanto as pernas ou para girar. As moças não nasceram para ficar na ponta dos pés. É como o tempo. Você pode até tentar ser aliado dele, mas chega uma hora que ele te supera”, analisa o diretor artístico do Ballet Teatro Municipal, Fauzi Mansur.

Elas sabem disto e aprendem cedo uma das lições mais duras do balé.

“Aos 20 e poucos anos, você atinge um nível técnico muito bom e depois você começa a sentir que o corpo faz um certo esforço a mais. Também vêm outras meninas mais jovens atrás. Então você tem que ter a cabeça para sentir que você foi até onde você pôde dar o máximo e que é natural você também dar lugar às mais jovens”, constata outra bailarina.

Mas quando se atinge o máximo, o auge?

“É quando ela se torna a primeira bailarina, quando ela entra em uma companhia e chega a ser uma estrela. Eu acho que esse é o auge”, avalia outra bailarina.

Neste momento, elas parecem eternas e quase fazem a gente esquecer do tempo...

“Desde a primeira semana que eu tive o meu primeiro contrato profissional, eu senti essa era a vida que eu queria para mim”, garante a bailarina Ana Botafogo.

Uma vida de prazeres e restrições...

“Há dias que a gente fala: ah, hoje eu estou muito cansada... Por que eu inventei de dançar balé?”, revela Ana Botafogo.

Nos bastidores, o ritmo não é cadenciado. Há estranhos rituais de aquecimento, e um jeito pouco convencional de desejar boa sorte.

“Não pode falar ‘obrigada’ nem ‘boa sorte’. É ‘merda’, ‘quebre a perna’ e vamos dançar”, declara outra bailarina.

No palco, cada um vê na bailarina o ideal de beleza. Um pássaro?

“Um cavalo. É de uma pureza estética, uma pureza de linhas, de um olhar doce, é beleza pura”, compara Fauzi Mansur.

Nesta arte de mais de três séculos, a recompensa continua sendo uma só.

“Esta é a glória de todo bailarino: receber os aplausos no final de tudo”, afirma outra bailarina.



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